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Todas as Aventuras Marvel


(por Douglas Wolk)

Em muitas das minhas “resenhas” neste blog, antes de chegar no assunto principal, tenho a mania de falar do assunto que mais domino: eu (e, claro, minha relação com aquele material), para deixar claro ao leitor o meu viés ao escrever o texto.
E, claro, esse será um dos casos.

Comecei a ler os gibis da Marvel - e a DC - quando tinha uns 11 anos, em 1986, pegando revistas soltas numa banca que vendia usados. Não entendi muito o que li - boa parte desse material tem um grau de auto-referência intimidador - , mas me interessei e (junto de meu irmão) fui atrás de mais e mais revistas para tentar saber mais. Com o tempo e mesadas, foi pegando em bancas as novidades, ao mesmo tempo que escavávamos feiras do rolo e sebos (saudades, Livraria Muito Prazer) e afins atrás de mais peças do grande quebra-cabeças que é esse tipo de leitura.
Com algumas calmarias, essa febre durou até quase a metade dos anos 90, quando a rotina puxou (cursinho, faculdade)(dois estrondosos fracassos da minha vida :P) e o dinheiro minguou.
Anos depois, as coisas melhoraram e até tentei retomar o vício, mas estranhei as histórias, personagens, autores. A narrativa seguiu e fiquei para trás. Mas ficou um enorme conhecimento de gibi de hominho dos anos 70/80 - que obviamente considero a melhor época para os comics, sem dúvida alguma - e bastante informações soltas do que aconteceu antes e depois :P

(atualmente, até pego coisa ou outra contemporânea, mas só com referência de pessoas confiáveis)

Mas, vamos falar desse livro: Douglas Wolk, o autor, diz ter lido tudo da Marvel entre 1961 e 2017 (27206 revistas, segundo a planilha dele)(e logo me respondeu uma das maiores dúvidas dessa empreitada: sim, ele pirateou) e... eu duvido que realmente tenha feito isso, você também duvida, um monte de gente duvida, e entrei no grupo dos que pagaram para ver e o que encontrei foi:
• quase 70 páginas, os três primeiros capítulos, que para mim são o melhor do livro, tentando responder coisas tipo o que é o universo Marvel? Como abordar essa montanha de gibis? (dica: nunca pelo começo). Tenho a necessidade de ter lido tudo? (Não. Ler este tipo de gibis te dá (ou deveria dar) a consciência de que nunca conseguirá ler tudo e de que tudo está conectado :P) O que é multiverso? Cronologia?, entre outras questões e notas importantes.
Como leitora de “gibis esquisitos” (opinião de parentes, na adolescência), poucas vezes me senti tão acolhida num texto :P O autor me pegou, como leitora, pela paixão dele :3

Depois dessa introdução, nosso leitor-autor nos apresenta as linhas narrativas que ele achou mais interessantes dentro do emaranhado de gibis da Marvel:
• o primeiro capítulo é sobre o Quarteto Fantástico, onde tudo começou. E aqui fica claro como Wolk vai tratar as revistas: ele pinça uma revista que acha interessante na época de Stan Lee e Jack Kirby e vai e volta no tempo, pondo quase todo o foco no run desses autores, que são basicamente o cerne de quase tudo o que foi feito sobre os personagens.
• o Homem-Aranha é a segunda linha narrativa escolhida para ser puxada. O que faz sentido, já que o personagem é carro-chefe da Casa das Idéias desde que surgiu. Achei interessante ele abordar o personagem como cíclico: alguém em crescimento/desenvolvimento que, quando chega no ponto máximo, cai para reiniciar novo ciclo (e manter o status quo). Segundo o autor, já houveram seis (ou sete) ciclos assim. Outra coisa interessante é mostrar que muitos dos vilões iniciais eram figuras paternas falhas (o herói é órfão e deixou o tio (figura paterna) morrer).
Mestre do Kung-Fu não é uma linha narrativa que está no cerne da Marvel. Mas Wolk decide falar desse gibi porque considera uma pérola perdida na montanha de revistas em quadrinhos - eu lembro de ter lido algumas histórias, mas não me pareceram ser interessantes porque não eram meu tipo de gibi na época. Nesse tópico além do personagem, trama e autores, vem outro tema: representações de chineses e japoneses nos comics, com estereótipos, preconceitos (o personagem é derivado de Fu Manchu, o Perigo Amarelo em pessoa na cultura pop) e erros graves na colorização. Também cita as discussões nas sessões de carta (uma cultura que faltou ter por aqui) e desconfio que o personagem só ganhou espaço no livro porque um dos leitores mais ativos nas seções de carta virou escritor e, imagino, contatinho do Douglas.
• óbvio que os X-Men e o resto da mutandade são a terceira linha narrativa central e seu núcleo é a fase de Chris Claremont e John Byrne: a tese aqui é que todas as histórias mutantes tentam emular em algum grau a Saga da Fênix Negra ou Dias de Um Futuro Esquecido, dois clássicos dos personagens. Também foca nas diferenças entre os dois autores citados (amo quando ele expõe alguns claremontismos) e na (poderosa, necessária) metáfora que os mutantes são para as minorias.
• entre os capítulos sobre títulos-chave da editora, tem alguns textos menores sobre temas curiosos. Começa com em que ele fala rapidamente sobre os gibis de monstros da Marvel - que foram bem comuns nos anos 50/60. Inclusive, chega a lembrar que a 1a história do Quarteto é praticamente uma história típica de monstros do período (isso se não for um roteiro reciclado). Depois tem um breve perfil de Stan Lee, Jack Kirby e Steve Ditko, o impacto da Guerra do Vietnã nas histórias e o papel da música dentro do Universo Marvel (Cristal, Lyla Chenney e Rick Jones: é com vocês!). Em seguida, as notícias de filmes da Marvel antes dos filmes do MCU existir (uma longa sequencia de décadas de promessas e anúncios que nunca se realizaram).
• o capítulo que trata de Thor (e de Loki) foi o primeiro em que começo a sentir o poder do tempo, ou melhor: do tempo que não li mais a Marvel com regularidade. Quando fala do Thor, reconheço a parte dos Contos de Asgard (que parecem mesmo ser a parte mais interessante daquele personagem insosso) e sou tiete da fase do Simonson (“o único Thor válido”, vivo repetindo). Mas o que vem depois, a parte da Jane Foster (que até li, a idéia me cativou, mas achei o roteiro truncado) e ascensão do Loki como personagem interessante, está nas margens do meu radar apenas.
• assim como Loki, falar do Pantera Negra me causou estranheza como linha narrativa importante. Talvez porque os personagens começaram a ganhar holofote depois dos filmes, talvez porque simplesmente as fases boas deles são recentes demais para essa joaninha anciã ter lido. Há informações interessantes sobre sua gênese (o nome ser idêntico à organização gringa foi pura concidência) e acho que há até algum espelhamento de importância com Shang Shi. Mas, sei lá.
• ainda falando dos mini-capítulos entre os capítulos, temos um sobre as aparições/citaçõpes de presidentes reais na cronologia...
• ...seguido de um capítulo falando de Reinado Sombrio, um arco enorme de revistas onde o vilão Norman Osborn se torna presidente. Não a li, foi escrita majoritariamente durante o governo Obama, mas os paralelos citados com o primeiro e esse segundo mandato do Trump ativam o sentido de aranha de qualquer um com senso político. O capítulo (grande) seguinte trata das Guerras Secretas (a dos anos 80 e a de 2015) e dos apocalipses daquele mundo ficcional.
• mais mini-capítulos: um trata de março de 1965, quando a cronologia da Marvel parece ter começado efetivamente e outro sobre Linda Carter, uma enfermeira que teve título próprio nos anos 60, sumiu e reapareceu décadas depois. Douglas cria uma teoria simpática de que ela seria na verdade o grande fio narrativo de décadas de gibis de hominho. Obviamente ele força a barra aqui, mas a idéia tem sua poesia, não dá para negar.
Miss Marvel e Garota Esquilo compartilham um capítulo. Dentro dele, a heresia de inserirem Fantastic Four 48 a 50 (a sacralíssima “Trilogia de Galactus”) como parte desse fio narrativo :P (mas, concordo: É brega e exagerada). São duas revistas que não li (ainda) mas concordo com uma coisa: atualmente as leitoras são mais dedicadas que os leitores de HQ. Mas não necessariamente de super-heróis.
(conheci umas duas leitoras de “gibi de hominho” que faziam umas interpretações e correlações (especialmente na Bat-Família) com bastante sentido e que fariam alguns nerds marmanjos espernearem pela gibisfera o resto da eternidade).

O livro se fecha com a narrativa de como os gibis da Marvel “conquistaram” seu filho através de sua complexidade, agradecimentos e um resumão da história da Marvel. E, claro, um pra lá de necessário índice remissivo.

# Veredicto: ainda não tenho certeza se ele realmente leu 27206 gibis, mas que nosso amigo tem carga, ele tem.
# Bom: a visão ampla das histórias, sem as idealizarem. Vi algumas resenhas reclamando da "política" no corpo do texto, mas é o tipo de gente que nunca leu direito as histórias e o livro só põe luz em alguns posicionamentos que aconteceram nos milhares de gibis. Alguns deles bastante problemáticos. Outro ponto que quero destacar são as centenas de notas de rodapé (447 na edição nacional), com mais informações, contextualizações ou apenas ironia. E, me repetindo, para mim o filé do livro é seu começo, com a apresentação desse mundo às pessoas de fora =p
# Mau: não ter lido tudo da Marvel (fiz uma conta rápida e devo ter lido umas 2000 histórias da editora) e não ter tido apego ao ler sobre o que não vivi em quadrinhos me faz acreditar que esse é um livro para já iniciados. Fora isso, questiono várias linhas narrativas terem tido destaque e sinto falta de outras... mas é aquela coisa de escolhas pessoais. Talvez o livro só precisasse ser maior mesmo...
416 páginas • R$ 99,90 • 2023 • no site da editora

Índice de resenhas e movimentações da minha estante:

...e estou vendendo parte da minha coleção, veja a lista aqui

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blog/todas_as_aventuras_marvel.txt · Última modificação: 2025/05/06 19:38 por mushisama